Entrevista publicada em 20 de agosto de 2000 no Suplemento Conversa aos Domingos, do Poesia Diária - Literatura
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A original, uma recordação.
!."Eu, por mim, não dou nada/tomo, pego, arrebato/devolvo cada mau trato
Fico é fortalecida." Como encara Xristo que diz para dar a outra gace?
R- Cristo falava por metáforas. Dar a outra face não quer dizer, como foi entendido durante muitos anos - no sentido literal - se sujeitar ao Outro. Dar uma face seria confirmar a sua imagem e dar a outra face é oferecer ao Outro mais do que isso, é oferecer ao Outro uma perspectiva de si que não foi vista por ele. É propiciar que se veja em minha “outra face” como em uma tela em branco, na qual projete seu próprio filme e perceba que pode ser o protagonista de sua própria história. Essa atitude seria regida pelo amor daquele que se dá ao próximo, que oferece de si tentando estabelecer uma relação fraternal. Esta é uma das preocupações cristãs: fraternidade. Os homens deveriam ser companheiros de jornada na construção de suas histórias, delas sendo autores, sendo diretores e protagonistas de seus filmes, escolhendo os cenários e personagens. Sermos personagens imaginários nas histórias uns dos outros não dá certo e só traz frustração. Ele também disse : “Dai a César o que é de César...” Ou seja, fica assim delimitado cada espaço: cada um estava em seu âmbito, César e Deus, assim como as relações entre as pessoas, que devem ser verdadeiras e não hipócritas. Cristo pregava serenidade e não sujeição. Ele expulsou com chicote e irado os mercadores do templo. Não sentir raiva ou devolver com bondade uma humilhação, um mau trato, são construções institucionais( intencionais, muitas vezes) . Essa foi uma outra deturpação da fala de Cristo. Acho que nesse poema expresso um pouco isso. Digo um não à sujeição e à hipocrisia, que tanto enfraquecem o ser humano em suas relações com o outro e consigo mesmo.
2.O que o poeta tem de professor?
R- Muito. O poeta, como o professor, professa. Fala, é um arauto. Diz do seu tempo. Há sempre alguém querendo ouvi-lo, porque mesmo que diga de si, diz do outro. Essa é a grande responsabilidade dos dois. E o grande perigo. Há que se ter sempre uma postura de aprendiz. Dizem os budistas que ficar preso ao conhecimento está distante da sabedoria, porque o conhecimento só revela o objeto e não o verdadeiro Eu. Tento manter uma postura de respeito quando escuto e presto atenção ao que ouço e digo, principalmente às crianças. Tenho trabalhado com elas e vejo como guardam e recorrem ao que lhes é dito. Como gostam de ouvir histórias, reais ou imaginárias. E como transportam para suas vidas o que escutam. A palavra me encanta, mas reconheço que pode ser uma arma. Tenho horror àqueles que detém o poder através da palavra, assim como através do conhecimento. Mais uma vez o poeta e o professor se aproximam: os dois trabalham com a palavra e com o conhecimento. O poeta e o professor trabalham com a arte, com a criatividade, com a imaginação, com a sensibilidade, enfim. Têm uma função muito importante, pois estão sempre desequilibrando, provocando o surgimento de novos caminhos.
3.Quais is escritores que fazem a sua cabeça?
R - Fiz o clássico e ainda releio alguns dos autores que li, com a avidez de adolescente que descobre o mundo, naquela época conturbada e transformadora do final dos anos 60: Émile Zola, Sthendal, Bernard Shaw, Eugênio Evtuchenko, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Jorge Amado, Clarice Lispector, Rubem Braga. Decididamente eles fizeram e ainda fazem minha cabeça.
Clarice Lispector e Rubem Braga têm lugar especial na minha estante, junto aos meus poetas preferidos.
4.Caso fosse um verbete, como se definiria e a sua poesia?
R- Caminhante apaixonada e eterna aprendiz. A palavra me fascina e minha poesia traduz essa caminhada. E há os poetas que têm me acompanhado nessa jornada: Leminski, Cecília Meireles, Manoel de Barros, Carlos Drummond, Manuel Bandeira, para citar alguns do Brasil. E, pelo mundo, Bashô, Octávio Paz, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, Walt Whitman, Mario Benedetti.
5,Letra é poesia?
R- Eu diria que há poetas que fazem também letra de música, como Caetano, Edu lobo, Chico Buarque e Vinícius, que tem inclusive poemas que foram musicados. Mas são duas instâncias de composição diferentes: o poema é mais seco, direto e solitário que uma composição musical.
6.O que é poesia?
R- Poesia emana do que é poético. Os raios do sol da manhã, nas folhas, são diferentes dos da tarde. Percebê-lo nos transmite poesia. O sorriso de uma criança é poético. Mozart também.
A poesia pode estar na palavra ou no silêncio, sejam eles a expressão de uma fala ou a escrita de um dizer poético. Poema é essa escrita, vem a serviço do registro verbal da poesia.
7.Tem algum mote>
R -Justiça e liberdade são palavras às quais tento dar vida diariamente.
8,Qual o papel do escritor na sociedade?
R - Na arte existe a possibilidade de simbolização e o artista passa de criatura a criador. Na verdade, todos somos autores de nossas histórias, só não temos é consciência disso. Esse é um dos papéis do escritor, enquanto artista. Dar o testemunho de que os dramas e romances todos, reais ou imaginários, têm o mesmo valor de verdade, pois são nossas construções. Tudo é uma ficção: o sonho ou a realidade são, na verdade, versões múltiplas de um mesmo fato.
O escritor é, ainda, um grande interlocutor e também tem esse papel fundamental na sociedade. Sua obra é a imagem viva e expressiva de seu tempo e de sua cultura. Não tem como não ser engajado, portanto. Como disse antes com relação ao poeta e ao professor, o escritor também é um arauto e sua palavra é aguardada.
Grato
Rodrigo
Rodrigo
Muito grata, Rodrigo,
Sonia
At 21:53 10/07/00 -0300, you wrote:
>Salve, Rodrigo!
>Sinto-me honrada com o convite e claro que aceito!
>Vou providenciar ainda hoje o arquivo com o currículo, enquanto isso mando
>os poemas...
>Ps. Poderia matar a minha curiosidade? Como surgiu o meu nome para essa
>entrevista?
>Beijos
>Sonia Lanzillotte
>----- Original Message -----
>From: seomario
>To:
>Sent: Friday, July 07, 2000 12:27 PM
>
>
>
>
>Salve
>
>
>Sou Rodrigo de Souza Leão. Gostaria de entrevista-la para o LERo. Caso
>queira mande 3 poemas e o seu currículo em prosa.
>
>
>Rodrigo
>
>
>
>
>
At 21:53 10/07/00 -0300, you wrote:
>Salve, Rodrigo!
>Sinto-me honrada com o convite e claro que aceito!
>Vou providenciar ainda hoje o arquivo com o currículo, enquanto isso mando
>os poemas...
>Ps. Poderia matar a minha curiosidade? Como surgiu o meu nome para essa
>entrevista?
>Beijos
>Sonia Lanzillotte
>----- Original Message -----
>From: seomario
>To:
>Sent: Friday, July 07, 2000 12:27 PM
>
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>
>
>Salve
>
>
>Sou Rodrigo de Souza Leão. Gostaria de entrevista-la para o LERo. Caso
>queira mande 3 poemas e o seu currículo em prosa.
>
>
>Rodrigo
>
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>
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